• Homepage
    • Quem Somos
    • Colaboradores
  • Dossier
    • Raoul Walsh, Herói Esquecido
    • Os Filhos de Bénard
    • Na Presença dos Palhaços
    • E elas criaram cinema
    • Hollywood Clássica: Outros Heróis
    • Godard, Livro Aberto
    • 5 Sentidos (+ 1)
    • Amizade (com Estado da Arte)
  • Críticas
    • Cinema em Casa
    • Em Sala
    • Noutras Salas
    • Raridades
    • Recuperados
    • Sem Sala
  • Em Foco
    • Divulgação
    • In Memoriam
    • Melhores do Ano
    • Palatorium Walshiano
    • Passatempos
    • Recortes do Cinema
  • Crónicas
    • Ficheiros Secretos do Cinema Português
    • Nos Confins do Cinema
    • Raccords do Algoritmo
    • Week-End
    • Arquivo
      • Civic TV
      • Constelações Fílmicas
      • Contos do Arquivo
      • Ecstasy of Gold
      • Em Série
      • «Entre Parêntesis»
      • Filmado Tangente
      • I WISH I HAD SOMEONE ELSE’S FACE
      • O Movimento Perpétuo
      • Ramalhetes
      • Retratos de Projecção
      • Simulacros
      • Sometimes I Wish We Were an Eagle
  • Contra-campo
    • Caderneta de Cromos
    • Comprimidos Cinéfilos
    • Conversas à Pala
    • Estados Gerais
    • Filme Falado
    • Filmes Fetiche
    • Sopa de Planos
    • Steal a Still
    • Vai~e~Vem
    • Arquivo
      • Estado da Arte
      • Cadáver Esquisito
      • Actualidades
  • Entrevistas
  • Festivais
    • Córtex
    • Curtas Vila do Conde
    • DocLisboa
    • Doc’s Kingdom
    • FEST
    • Festa do Cinema Chinês
    • FESTin
    • Festival de Cinema Argentino
    • Frames Portuguese Film Festival
    • Harvard na Gulbenkian
    • IndieLisboa
    • LEFFEST
    • MONSTRA
    • MOTELx
    • New Horizons
    • Olhares do Mediterrâneo – Cinema no Feminino
    • Panorama
    • Porto/Post/Doc
    • QueerLisboa
  • Acção!
À pala de Walsh
Crónicas, Week-End 1

Eu Sou Tony Manero

De Vítor Ribeiro · Em Abril 26, 2020

I know you don’t get chance to take a break this often

I know your life is speeding and it isn’t stopping

You take my shirt and just go ahead and wipe up all the

Sweat, sweat, sweat

Lose yourself to dance(…)

Everybody dancing on the floor

Can’t do any more anymore

Everybody on the floor

Yeah, come on (lose yourself to dance).

Daft Punk – Lose Yourself to Dance

Tony Manero, nome de personagem e título do filme de 2008, realizado por Pablo Larraín, na primeira parte de uma trilogia que o cineasta dedicou ao seu Chile dos anos 1970, sob a ditadura armada de Pinochet, que prosseguiria, então, com Post Mortem (2010) e No (Não, 2012), com o actor Alfredo Castro como corpo condutor. Eram os tempos, estes da primeira década deste século, onde sopravam ventos renovados da América do Sul, outros corpos e personagens escapistas, de piscinas lamacentas e personagens sem cabeça, no topo norte da Argentina em La Ciénaga (O Pântano, 2001) de Lucrecia Martel ou o fervilhar da cidade do México e o sexo a quebrar a estratificação das classes em Batalla en el Cielo (Batalha no Céu, 2005) de Carlos Reygadas.

Tony Manero (2008) de Pablo Larraín – Raúl movimenta-se nos arrabaldes, numa predilecção por lugares rudes e sujos

Sabia que o general Pinochet tem olhos azuis? É a última coisa que uma idosa diz antes de ser agredida e assassinada com brutalidade por Raúl Peralta, o protagonista, que antes a ajudara após um assalto na rua. Ele leva-lhe a televisão, que depois trocará por uns ladrilhos de vidro, que servirão de palco improvisado, a iluminar a sua réplica da performance de Tony Manero, de Saturday Night Fever (Febre de Sábado à Noite, 1977, John Badham), interpretado por John Travolta, a que nos dedicaremos no artigo seguinte. A câmara móvel de Larraín, com enquadramentos deliberadamente incertos e negligentes quanto ás diagonais tradicionais, persegue o vai e vem sôfrego de Raúl, de Santiago para os arrabaldes, numa predilecção por lugares rudes e sujos, um clandestino sempre disponível para a rua, para o desenrasque, como uma ratazana que colhe os despojos. Se as acções de Raúl expressam crueldade e alheamento, as suas emoções ficam entregues aos visionamentos reiterados de Saturday Night Fever, onde devolve, numa sala deserta, os diálogos de John Travolta, um envolvimento total, material, que o leva a roubar a cópia do filme e a examinar os frames com o seu corpo debruçado sobre a película.

Raúl não alinha com a oposição clandestina, na sua resistência, na sua inquietude, ele assume o seu único propósito: abandonar o corpo à febre da dança.

Raúl partilha a casa com três mulheres, de três gerações, da matriarca à neta, cujos corpos lhe são oferecidos, e os favores sexuais exigidos, em troca de dormida e de um trabalho de coreógrafo num boteco apenso à habitação. Como cadelas com cio, a expressão é da matriarca, as mulheres procuram-no e falam em fugir dali, no futuro. Raúl responde: que futuro? E mais uma vez ele alinha-se com Travolta, que a princípio recusa uma fuga do bairro operário de Brooklyn, da família católica, do emprego na loja de materiais, o seu único futuro é a noite de sábado, no night club 2001 Odyssey (curioso nome, futurista). A habitação é, então, uma cápsula desse presente, com espaços escuros e desarrumados, uma compartimentação caótica, onde as actividades se associam e a intimidade é recusada, como Larraín explana na cena em que o banho de Raúl, num espaço que comunica com a cozinha, é observado por todos. Filme entregue ao corpo, ao corpo de um homem de 50 anos, urgência dos corpos, no apelo à gula inicial do sexo com uma rapariga mais jovem e principalmente na disponibilidade e na pujança exigida pela dança, mas também na falência dos corpos, de Raúl, que constrangido diz a idade quando responde ao inquérito do concurso de televisão, ou quando partilha o leito com a mulher do meio, que lhe diz – porque o Tony do filme nunca envelhece, enquanto que você, pode ficar velhinho. Os corpos quebram, então, os das mulheres que invejam o cio das mais jovens, de Raúl que, apartado do mundo e dos outros (algo que partilha com os personagens dos filmes com que abrimos este texto), não consegue concretizar todos os movimentos do disco-sound, do corpo pujante de Travolta. 

Tony Manero (2008) de Pablo Larraín – Raúl guarda as emoções para os visionamentos de Saturday Night Fever
Tony Manero (2008) de Pablo Larraín – que futuro, pergunta Raúl, quando as mulheres o desafiam para uma fuga
Tony Manero (2008) de Pablo Larraín – um banho paredes meias com o local de refeições

Há tanques que patrulham as ruas para fazer obedecer ao recolher obrigatório, a podridão do regime parece passar ao largo, mas surge com ecos tão pontuais quanto reveladores, envoltos na tal privação de futuro. Nos ensaios, Raúl recusa o que é tradicional, na música e na dança, para demonstrar à sua trupe como se faz, um criador sugado pela sua obsessão (que reproduz como um mantra os diálogos de Saturday Night Fever), até que o palco cede sob os seus movimentos, as tábuas estão podres, diz Raúl, como se fosse possível quebrar a podridão de uma sociedade, de um regime terrífico. Raúl não alinha com a oposição clandestina, na sua resistência, na sua inquietude, ele assume o seu único propósito: abandonar o corpo à febre da dança. 

Tony Manero (2008) de Pablo Larraín – Raúl solta-se para dançar

Na sequência final, no concurso de imitadores da televisão, quando D. Henrique, o popular apresentador, pergunta a Raúl o que ele faz, qual é a sua profissão, ele responde: isto, o espectáculo! Ele já não imita John Travolta: ele é Tony Manero.

Partilhar isto:

  • Twitter
  • Facebook
Alfredo CastroCarlos ReygadasJohn BadhamJohn TravoltaLucrecia MartelPablo Larraín

Vítor Ribeiro

"Não gosto da vida verdadeira e por isso me dedico à ficção. Se a literatura não existisse, eu mesmo a inventaria." Enrique Vila-Matas

Artigos relacionados

  • Crónicas

    Filmes nas aulas, filmes nas mãos

  • Crónicas

    Cenas do reino dos inquietos

  • Crónicas

    Porque não o cinema americano?

  • Manhattan Skyline | À pala de Walsh diz: Maio 31, 2020 em 11:00 am

    […] e diz-lhe que aquilo é só dançar. Tony responde: só dançar? Tal como na revisitação de Pablo Larraín e Alfredo Castro, a dança é uma libertação, do contexto social e familiar: o corpo, o indivíduo, solta-se para […]

  • Últimas

    • Vai~e~Vem #29: das mãos ao rosto, uma e outra vez

      Janeiro 20, 2021
    • “Dos Monjes”: o virtuosismo do melodrama para uma definição de “Expressionismo Mexicano”

      Janeiro 19, 2021
    • A minha colecção sou eu

      Janeiro 18, 2021
    • Filmes nas aulas, filmes nas mãos

      Janeiro 17, 2021
    • “The Godfather Coda: The Death of Michael Corleone”: como escangalhar uma obra-prima

      Janeiro 14, 2021
    • “Dans la maison”: o cineasta-térmita confinado nas suas personagens

      Janeiro 12, 2021
    • “A Mulher Que Fugiu”: a não presença do nada

      Janeiro 11, 2021
    • Cenas do reino dos inquietos

      Janeiro 10, 2021
    • “The Godfather: Part III”: o melhor da trilogia (para mim, entenda-se)

      Janeiro 7, 2021
    • O enigma Ozu: visto pelos outros e pelo próprio

      Janeiro 6, 2021

    Goste de nós no Facebook

    • Quem Somos
    • Colaboradores
    • Newsletter

    À Pala de Walsh

    No À pala de Walsh, cometemos a imprudência dos que esculpem sobre teatro e pintam sobre literatura. Escrevemos sobre cinema.

    Críticas a filmes, crónicas, entrevistas e (outras) brincadeiras cinéfilas.

    apaladewalsh@gmail.com

    Últimas

    • Vai~e~Vem #29: das mãos ao rosto, uma e outra vez

      Janeiro 20, 2021
    • “Dos Monjes”: o virtuosismo do melodrama para uma definição de “Expressionismo Mexicano”

      Janeiro 19, 2021
    • A minha colecção sou eu

      Janeiro 18, 2021
    • Filmes nas aulas, filmes nas mãos

      Janeiro 17, 2021
    • “The Godfather Coda: The Death of Michael Corleone”: como escangalhar uma obra-prima

      Janeiro 14, 2021

    Etiquetas

    2010's Alfred Hitchcock Clint Eastwood François Truffaut Fritz Lang Jean-Luc Godard John Ford João César Monteiro Manoel de Oliveira Martin Scorsese Orson Welles Pedro Costa Robert Bresson Roberto Rossellini

    Categorias

    Arquivo

    Pesquisar

    © 2020 À pala de Walsh. Todos os direitos reservados.