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Valley of Love (2015) de Guillaume Nicloux

De Raquel Morais · Em Abril 4, 2017

Nas minhas raras, mas apreciadas, idas a estádios de futebol, dei muitas vezes por mim a olhar para uma parte do campo ou para um jogador ao qual ninguém estava a prestar atenção. Justificadamente, todos olhavam para a bola, já que é a bola que decide o resultado de um jogo. Um movimento esquisito de perna de um guarda-redes desocupado, a inesperada cor de um placard de publicidade são naquela arena coisas acessórias.

O filho desaparecido de Gérard (Depardieu) e Isabelle (Huppert) é a bola de Valley of Love (Vale de Amor, 2015), o que traz a equipa para a frente, o que faz com que o filme avance, um pretexto para levar dois actores franceses até à costa oeste dos Estados Unidos, uma desculpa, uma história. Enquanto bons ouvintes de histórias, é importante baixarmos os braços e deixarmo-nos ir, embalados naquela coisa a que se chama suspensão da descrença. As próprias personagens o fazem, entregam-se ao conto fantástico que o filho lhes deixou e, ao jeito do teatro, revelam-nos, elas próprias, a parte da história que está para trás, como se a recontassem também um ao outro. Apesar da faceta lúdica e do carácter instrumental da situação inicial, esse ponto de partida não é despiciendo.

A história de um filho morto que envia a cada um dos pais, há muito separados, uma carta onde lhes pede que se reúnam, durante sete dias, no Vale da Morte, para de alguma forma o encontrarem, não se limita a ser sedutora – tem efectivamente algo de substancial. É, se quisermos, uma história de fantasmas: o modo como a luz entra pelas janelas dos quartos de Isabelle e de Gérard sublinha isso, tanto quanto a luminescência que recobre, nos planos nocturnos, os corpos das personagens principais. Mas esta é uma história de fantasmas à moda de Henry James (o James do The Turn of the Screw, do The Beast in the Jungle, do The Portrait of a Lady: pessoas acham que coisas acontecem, pessoas esperam que coisas aconteçam, coisas acontecem porque pessoas esperam que coisas aconteçam – respectivamente).

Que não se possa levar uma história de fantasmas a sério só porque esta se passa em plena luz do dia, sob um calor tórrido, com figuras que usam calções e têm ananases nas camisas é, no mínimo, uma pena.

Que não se possa levar uma história de fantasmas a sério só porque esta se passa em plena luz do dia, sob um calor tórrido, com figuras que usam calções e têm ananases nas camisas é, no mínimo, uma pena. Assim como me parece uma pena que grande parte dos espectadores possa ir ver Valley of Love à espera de ver um filme sobre um par de pais em luto. Isto porque o lado emotivo deste trabalho de Guillaume Nicloux pode ser inequívoco, mas não é o que nele mais importa e está longe de ser o mais bem conseguido.

O centro do filme (ou pelo menos aquilo em que devíamos centrar o nosso olhar) são as suas desarmonias, as suas desproporções: uma aldeia-oásis que desponta no meio do deserto; um carro climatizado que avança pelo meio do calor; os sons que saem de duas bocas francesas e que colidem com o inglês daquelas outras bocas americanas – os primeiros soam a coisa ténue, esfumada, por oposição aos segundos, sons protuberantes, bem fixados; a figura pequena e franzina de Huppert ao lado do corpo gigantesco de Depardieu; o camiseiro alaranjado dela contra o amarelo da terra seca; um pequenino boné vermelho (Travis, agora Trump) no topo da cabeça de Depardieu, que podia ser um monstro marinho, submerso numa piscina muito azul.

Tudo isto são trivialidades, pormenores, mas são o que mais interessa ali, o que não me parece, de todo, um sinal de fraqueza. Há um alívio qualquer em saber que ver filmes também pode ser reparar nos jogadores que estão em repouso, que não têm a bola. Quando saí do cinema esperava encontrar uma rua quente e abafada, espantei-me até por não a encontrar. Imagino que isso tenha acontecido porque Valley of Love nos envolve na sua moinha, porque cria uma atmosfera. Há uma palavra alemã com ecos importantes na filosofia e na arte, que era usada originalmente no campo da música e que me parece neste contexto relevante: Stimmung. Na origem estará Stimme (voz) e o verbo stimmen, que pode ser traduzido como “estar certo, estar conforme” e, em termos musicais, “afinar”. Stimmung tem um conjunto diverso de acepções que incluem humor, atmosfera, afinação. Aqui, importa precisamente colocar lado a lado uma ideia de atmosfera e de afinação.

No filme de Nicloux, as coisas surgem deslocadas, como se o Vale da Morte fosse uma outra dimensão. De facto, há muito pouco de real naquela estância, naquela paisagem que deixa de estar ligada ao mundo, como os telemóveis progressivamente menos operacionais lembram, como se Gérard e Isabelle passassem, a certa altura, para o outro lado do espelho. E há até figuras estranhas, inadequadas que, como coelhos, os atraem ou lhes deixam estranhas mensagens.

Ora, o modo como certos objectos parecem deslocados aponta para uma necessidade de afinar as vozes, de harmonizar tons, de pô-los em concordância. Parece ser essa exactamente a tarefa que Gérard e Isabelle têm de cumprir. Não se trata exactamente de criarem uma concordância entre si (o casal separado, de novo reunido para satisfazer a vontade do filho que ambos negligenciaram), porque dizer isso é ler o filme de forma psicologizante. Trata-se sim de atingir o tom certo, precisamente num lugar onde reinam as dissonâncias. O tema musical que abre e fecha o filme ecoa a afinação dos instrumentos de uma orquestra antes do início de um concerto. Se as cordas apontam para um lado dramático, os sopros que aparecem mais adiante têm algo de levemente tenebroso, como num filme de terror. No início, aquele tema anuncia que algo vai acontecer.

A propósito disto, não deixa de ser curioso o lado do filme que reflecte sobre si próprio – mas não porque Isabelle se chama Isabelle ou Gérard se chama Gérard. Nem mesmo porque o filho desaparecido era fotógrafo (ainda que seja divertido imaginar um filho fotógrafo que encenasse a própria morte só para levar os pais até ao Vale da Morte e com eles fazer postais como aqueles que Valley of Love nos envia). O filme reflecte sobre si próprio porque se Gérard e Isabelle esperam, também o público é posto nessa mesma posição de quem espera a fera na selva. Os mais incautos talvez achem que a fera salta no fim, que o encontro era a fera. Seremos como Gérard e Isabelle, que não conhecem a face do bicho. Resta esperar que alguns de nós se tenham entretido a observar um veraneante desocupado ou a inesperada cor de uma parede ou do interior de um bar. No final, a música que ouvíamos no princípio regressa, tão só para confirmar que, efectivamente, algo aconteceu.

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Raquel Morais

“Teus dois cinemas, um ao pé do outro, por que não se afastam/ para não criar, todas as noites, o problema da opção/ e evitar a humilde perplexidade dos moradores?/ Ambos com a melhor artista e a bilheteira mais bela,/ que tortura lançam no Méier!”

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