• Homepage
    • Quem Somos
    • Colaboradores
  • Dossier
    • Raoul Walsh, Herói Esquecido
    • Os Filhos de Bénard
    • Na Presença dos Palhaços
    • E elas criaram cinema
    • Hollywood Clássica: Outros Heróis
    • Godard, Livro Aberto
    • 5 Sentidos (+ 1)
    • Amizade (com Estado da Arte)
    • Fotograma, Meu Amor
  • Críticas
    • Cinema em Casa
    • Em Sala
    • Noutras Salas
    • Raridades
    • Recuperados
    • Sem Sala
  • Em Foco
    • Divulgação
    • In Memoriam
    • Melhores do Ano
    • Palatorium Walshiano
    • Passatempos
    • Recortes do Cinema
    • Se Confinado Um Espectador
  • Crónicas
    • Filmes nas aulas, filmes nas mãos
    • Nos Confins do Cinema
    • Recordações da casa de Alpendre
    • Se Confinado Um Espectador
    • Week-End
    • Arquivo
      • Civic TV
      • Constelações Fílmicas
      • Contos do Arquivo
      • Ecstasy of Gold
      • Em Série
      • «Entre Parêntesis»
      • Ficheiros Secretos do Cinema Português
      • Filmado Tangente
      • I WISH I HAD SOMEONE ELSE’S FACE
      • O Movimento Perpétuo
      • Raccords do Algoritmo
      • Ramalhetes
      • Retratos de Projecção
      • Simulacros
      • Sometimes I Wish We Were an Eagle
  • Contra-campo
    • Caderneta de Cromos
    • Comprimidos Cinéfilos
    • Conversas à Pala
    • Estados Gerais
    • Filme Falado
    • Filmes Fetiche
    • Sopa de Planos
    • Steal a Still
    • Vai~e~Vem
    • Arquivo
      • Estado da Arte
      • Cadáver Esquisito
      • Actualidades
  • Entrevistas
  • Festivais
    • Córtex
    • Curtas Vila do Conde
    • DocLisboa
    • Doc’s Kingdom
    • FEST
    • Festa do Cinema Chinês
    • FESTin
    • Festival de Cinema Argentino
    • Frames Portuguese Film Festival
    • Harvard na Gulbenkian
    • IndieLisboa
    • LEFFEST
    • MONSTRA
    • MOTELx
    • New Horizons
    • Olhares do Mediterrâneo – Cinema no Feminino
    • Panorama
    • Porto/Post/Doc
    • QueerLisboa
  • Acção!
À pala de Walsh
Crónicas, Ecstasy of Gold 0

Conto de fados

De Tiago Ribeiro · Em Fevereiro 5, 2015

Quando um dia perguntaram ao Sergei Parajanov o que achava da sua obra pré-1965 [isto é, antes de Tini zabutykh predkiv (Sombras dos Antepassados Esquecidos, 1965), o filme que lhe abriu as portas dos miseráveis países capitalistas do Ocidente], a resposta dada foi esta: “puro lixo”. Assim classificava o barbudo toda a sua filmografia inserida no realismo soviético, uma mistura de desbragada propaganda, universo kitsch, melodrama musical de fervor nacionalista e onde os operários andavam felizes da vida e a religião era considerada obra de satanás. Bons velhos tempos, esses, em que uma nação inteira era o verdadeiro Sol na Terra, como mais tarde nos diria o Dr. Álvaro Cunhal. Sergei vivia nas boas graças dos sábios censores e, por isso, ainda menos se compreende como no tal ano de 1965 decidiu enveredar pela carreira de cineasta. Se calhar o Sol não lhe chegava.

Aprili (1961) de Otar Iosseliani

Também proveniente da Geórgia, terra de bons vinhedos, Otar Iosseliani iniciaria o seu ofício pela mesma época de Parajanov, embora fosse dez anos mais novo. Antes disso, fora instruído em Moscovo pelos mestres de outrora (Dovzhenko, Kozintsev, Kulechov, etc), que muito avisadamente foram colocados na prateleira (aka a dar aulas) pelo regime, visto que a admiração e a diligência com que serviram a causa décadas antes parecia estar a dar lugar a diversos tipos de questionamento e possíveis dissidências. Lamentavelmente, mestres Stalin e Khrushchev não perceberam que ao enviarem tais artistas para a academia, estariam a promover indirectamente a formação de homens inconformados e incorrigíveis, sendo o jovem Otar um deles. Também para este o Sol não parecia suficiente.

O Iosseliani começou a todo o gás, com uma primeira curta-metragem que lhe prontamente granjeou o rótulo de “censurado”. Nada mais certo, pois Aprili (1961) é, segundo as palavras maliciosas e capitalistas do próprio, “um conto de fadas, e os contos de fadas são muito perigosos para os regimes totalitários”. Como se não lhe bastasse a fantasia etérea e eterna, ainda foi ao cúmulo de a apimentar com uma contundente crítica social, económica e arquitectónica, mostrando assim todo o seu desrespeito pela mão que lhe dava porrad…de comer. Um “conto de fadas” amoroso a quebrar o granito do realismo é uma coisa, agora adocicar isso com incisivas machadadas às políticas de diversa índole do glorioso regime é outra. Censurado, evidentemente. Só onze anos depois, já com mestre Brejnev aos comandos da Estação Solar, é que Aprili veria a luz do dia em terreno soviético.

Para tornar tudo isto ainda mais feio, há que dizer que Aprili parece dever muito ao universo de um artista ocidental e que tinha pouco cuidado com as suas economias, espatifando-as a todas em produções cinematográficas, de seu nome Jacques Tati. Escrevemos “parece” porque há pouca certeza de que Otar conhecesse a obra do francês gastador, visto que no Planeta-Sol só tinham cabimento filmes em que uma pessoa, depois de os ver, dissesse com toda a justeza: “isto sim, isto é que é realista!”, e até se escreve isto com a emoção a escorrer pelos dedos. Voltando a Aprili: desde a ausência de diálogos até a uma linguagem completamente inventada, passando pela passagem de testemunho de uma vida rural para uma citadina, e ainda situações onde o absurdo só pode ser cómico, não temos dúvidas de que alguém andou, provavelmente, a fazer contrabando de filmes de Jacques para o Planeta Vermelho, com Iosseliani a vê-los às escondidas nalgum cineclube dissidente e imperialista. Se alguém souber que estamos a mentir, que nos corriga.

Outro artista que nos traz à memória, embora seja forçar já muito a barra, será o imperialista George Orwell, que no seu “1984” colocava a intimidade de um casal esmagada e subjugada pelo poder estatal. Em Aprili não há ratazanas em caixas, nem espiões disfarçados de velhinhos donos de hotéis, mas há a mesma luta de um casal em preservar a sua relação sem que que terceiros a interrompam quase por decreto. E quando essa relação é consolidada, é através da institucionalização da “casa, móveis, e a seguir, com jeito, vêm já os filhos”, o que deveria satisfazer qualquer um, mas não o georgiano, que vai sabotando aos poucos todo esse bom trabalho que o regime do Satélite Solar providenciava aos seus acólitos. Mal agradecido.

E depois um rapaz, uma rapariga, uma árvore e umas ovelhas: o primitivismo e a simplicidade, tanto de modo de vida como de mise-en-scène, que se tornou em algo que reconhecemos nos filmes iosselianos, pelo menos os que já vimos, e ainda nos faltam alguns. Narrativas onde parece evidente um grande prazer em mostrar as grandes matérias da vida, como beber um copo de vinho, comer um pão, ou dar um beijo. Com o picaresco sempre ao seu lado; cinema modesto na mais admirável das suas propriedades; afinal, Otar disse que “a ideia de fazer ‘Grande Cinema’ repugna-me”, a rimar com o “o que me alimenta é uma perna de borrego, não é o cinema” de Monteiro. Ou umas fanecas fritas.

Partilhar isto:

  • Twitter
  • Facebook
Alexander DovzhenkoGrigori KozintsevJacques TatiJoão César MonteiroLev KuleshovOtar IosselianiSergei Parajanov

Tiago Ribeiro

Em Dezembro de 1963, Jean-Luc Godard, sentado numa esplanada em Saint-Germain-des-Prés, proferiu o seguinte: "estou sentado numa cadeira numa esplanada e o cinema faz este mês sessenta e oito anos". Um "jeu de mot" polémico (como sempre, no mestre) mas que em retrospectiva nos parece de uma clarividência singular.

Artigos relacionados

  • Crónicas

    O (des)conforto do espectador solitário

  • Crónicas

    Meus presentes de outubro: os filmes de Manoel de Oliveira

  • Crónicas

    O sabor do peixe no Outono

Sem Comentários

Deixe uma resposta Cancelar resposta

Tem de iniciar a sessão para publicar um comentário.

Últimas

  • Beijo e gancho de ferro

    Abril 22, 2021
  • “El anacoreta”: causa de morte, o fora de campo

    Abril 21, 2021
  • Christian Petzold: “Tens de regressar à fotografia para compreenderes algo sobre o cinema”

    Abril 19, 2021
  • A fronteira entre a morte e o movimento no cinema

    Abril 17, 2021
  • Fantasmas em trânsito

    Abril 15, 2021
  • “Quai d’Orsay”: obrigado, Tavernier (a Stabilo Boss)

    Abril 13, 2021
  • What’s in a frame

    Abril 12, 2021
  • O (des)conforto do espectador solitário

    Abril 11, 2021
  • Fragmentos de um discurso incestuoso

    Abril 10, 2021
  • Sobre uma imagem adormecida

    Abril 8, 2021

Goste de nós no Facebook

  • Quem Somos
  • Colaboradores
  • Newsletter

À Pala de Walsh

No À pala de Walsh, cometemos a imprudência dos que esculpem sobre teatro e pintam sobre literatura. Escrevemos sobre cinema.

Críticas a filmes, crónicas, entrevistas e (outras) brincadeiras cinéfilas.

apaladewalsh@gmail.com

Últimas

  • Beijo e gancho de ferro

    Abril 22, 2021
  • “El anacoreta”: causa de morte, o fora de campo

    Abril 21, 2021
  • Christian Petzold: “Tens de regressar à fotografia para compreenderes algo sobre o cinema”

    Abril 19, 2021
  • A fronteira entre a morte e o movimento no cinema

    Abril 17, 2021
  • Fantasmas em trânsito

    Abril 15, 2021

Etiquetas

2010's Alfred Hitchcock Clint Eastwood François Truffaut Fritz Lang Jean-Luc Godard John Ford João César Monteiro Manoel de Oliveira Martin Scorsese Orson Welles Pedro Costa Robert Bresson Roberto Rossellini

Categorias

Arquivo

Pesquisar

© 2020 À pala de Walsh. Todos os direitos reservados.