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Providence (1977) de Alain Resnais

De João Palhares · Em Novembro 23, 2012

O dicionário diz-nos que providência vem do latim, de providentia, e significa “disposição ou medida prévia que se toma para promover um bem, evitar um mal, conseguir um fim, remediar uma necessidade” (perto de cautela, prudência e prevenção), “pessoa que guarda” (protector), “circunstância ou acontecimento feliz” e “omnipotência com que Deus dirige o curso dos acontecimentos, de forma a que os seres cumpram os seus destinos” – a Divina Providência. No filme de Alain Resnais, é-nos primeiro apresentada como uma coisa muito simples: o nome da imensa moradia de Clive Langham (interpretado por John Gielgud).

Quando vi este filme pela primeira vez, ele pareceu-me dividido em duas partes com a mesma duração, uma terrível e outra luminosa mas ainda mais terrível porque me tinha parecido de uma falsa-luminosidade. Ora, as duas partes não têm a mesma duração, a primeira é muito maior que a segunda. Embora talvez seja compreensível ter pensado isso porque Providence (1977) começa e progride em sucessão-relâmpago até à realidade pausada e onírica dos últimos 25 minutos. A “falsa-luminosidade”, essa, varreu-se-me do pensamento, porque onde dantes via ironia agora já não sei bem o que vejo… O segundo dos dois filmes que Resnais realizou nos anos 70 [o outro foi Stavisky… (Stavisky, o Grande Jogador, 1974), três anos antes] é, ao mesmo tempo, a mais clássica e a mais elíptica e fugidia obra do francês. É sobre o mundo dos sonhos, sobre o processo criativo. Dizem que tem contornos “lovecraftianos” – já lá iremos outra vez -, e foi Lovecraft quem escreveu, em Beyond the Wall of Sleep: “I have often wondered if the majority of mankind ever pause to reflect upon the occasionally titanic significance of dreams, and of the obscure world to which they belong, (…) whose vaguely exciting and disquieting effect suggests possible minute glimpses into a sphere of mental existence no less important than physical life”…

Mas o que nos conta e nos mostra Providence? Os primeiros planos encaminham-nos para Providence – passa-se tudo dentro daqueles portões – e, saberemos depois, para a mente divagante de Clive Langham. “Damn, damn, damn… damn!”. Entre sonho, realidade, bebedeira e dores lancinantes, assistimos ao “pequeno teatro” de Langham, povoado de culpas, monstruosidades, distorções, vaidade, auto-aversão e teimosia. Os actores são a família. Que seja tudo apresentado de forma não-linear, tanto melhor, porque como se filma o sonho? Assim: Providence… As árvores e as sombras, os troncos e os fachos de luz, o candeeiro e as traseiras que dão para o recanto sujo e pestilento de Clive Langham e para os recantos sujos e pestilentos da sua consciência. Está a escrever o último livro. Quem irá ele estripar desta vez? O vinho que está em todo o lado, tanto nas mesas e nas cozinhas, nos quartos de hotel e nas varandas, como por baixo dos lençóis de Langham a empestar o quarto, no chão ou sabe-se lá onde mais. Sempre a acabar, o vinho, e não se torna melhor nem mais fácil ter que inventar aquele mundo ou domar aqueles monstros. E as dores continuam e os prédios desabam, as escadas inventam-se sozinhas, os décors transformam-se e as palavras não querem vir das pessoas certas; elas não querem cooperar, os monstros cospem insultos venenosos que fazem tudo doer mais e mais, ainda. Langham, Langham… Abre-se o julgamento de Clive Langham. Levante-se o réu. “I was confused (As indeed we all are in this court today) But it wasn’t murder (But you did shoot him?) Yes (And you seriously plead that this was an act of mercy?) Yes (Whereas in the eyes of the lord it was plain homicide) I was confused (As indeed we all are…)”. Ecos e repetições. O retrato na mesa de cabeceira. A mulher, Molly. “Don’t take Molly!”, grita Langham. Fantasmas, dores e atmosferas de Poe e não só Lovecraft. “Ulalume, Ulalume”. As palavras e as perdas terríveis, as impronunciáveis: Guernica, Hiroshima, Muriel, Molly, Providence. “Tu n’as rien vu”… “Vous n’avez encore rien vu”… Que é da Divina Providência ter que sofrer assim? O providente Langham não provê o bastante para aguentar com os resígnios da Providência. “I think people should be allowed to die the way they choose”. A banheira de sangue, o remorso, as “pains up the ass”. Quando se trabalhou tanto para fazer da vida um sonho, os sonhos deixaram de ter vida e fede tudo a morte, vinho e doença. Providence. Fez-se de tudo um jogo, brincou-se demais. Quem ganhou e quem perdeu? “Point for father… point for father”, diz Langham, o déspota. Congeminou-se tanto e a aurora está a chegar. A luz rebenta pelas paredes e pelo mundo do sonho, fazendo-o abrir os olhos. Luz de mais, luz a mais. Molly, Helen, Claude, Sonia e Kevin já mal se vêem… Abrir os olhos é perder a visão e o acesso àquele mundo. Langham transforma-se…

 ***

Os cães e os prados verdes de Providence. A luz é já a do meio-dia, o trabalho sujo foi já todo feito e Langham está limpo e esquecido dos terrores da noite passada. Vai receber os filhos e a nora no dia do seu aniversário. 78 anos. “Seventy-eight fucking years, today. Molly would have seventy-one”. Os últimos flashes para resolver a equação. O cadáver do passado e o cadáver do porvir. As últimas peças do puzzle. De chapéu, recebe vinho dos criados e tudo é onírico, dos cães felizes a abanarem as caudas aos pios e chilreios dos pássaros. A casa com fachada de musgo ou ervas-daninhas. Um sol abrasador. Deve ser Julho ou Agosto. Claude e Sonia são os primeiros a chegar, beijos na cara e na testa, ela oferece-lhe uma faca que pertenceu a Hemingway e, ele, um livro. Chega Kevin, o “filho bastardo preferido”, como Langham lhe chama, com um telescópio para o pai. Claude e Kevin estão agora a brincar com os cães e Langham diz a Sonia que nunca percebeu o filho mais velho, porque nunca teve vícios detectáveis. “I’m his detectible vice”, responde-lhe ela. Langham sente-o a olhar e diz que disso sempre se lembrou. Dos olhares reprovadores do filho. Sempre sentiu que o achava culpado do suicídio da mãe. Em conversa com o pai, antes do almoço, Claude diz-lhe que nunca o culpou pela morte da mãe. Não é o fim do assunto, com certeza. À mesa fala-se de política e conduta, a câmara vagueia pelos prados, no único vislumbre que nos é dado da imensidão de Providence. O velho despede-se dos filhos… “No kissing, no touching”. Olham todos para trás. Pode ser a última vez…

Ou pode ser que Langham não morra. Pode ser que se transforme no Terrible Old man de Lovecraft (eu não disse que cá voltava?), ganhe olhos amarelos e fale com as vozes dentro das garrafas atadas ao tecto e renovado com forças fantásticas por ter tanta dor e tanto arrependimento às costas. Se calhar, é melhor estar sozinho, impassível, no seu castelo, “so old that no one can remember when he was young, and so taciturn that few know his real name. Among the gnarled trees in the front yard of his aged and neglected place”… Em Providence.

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"You are truly a pile of dog shit, Cardinal."

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