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À pala de Walsh
Críticas, Em Sala 1

Plemya (2014) de Myroslav Slaboshpytskyi

De Carlos Alberto Carrilho · Em Abril 19, 2017

Num comentário recente no jornal Público, o adido de imprensa da embaixada da Rússia em Portugal acusava a embaixadora da Ucrânia de, num artigo de opinião, ter omitido que a existência do país enquanto Estado se devia ao regime soviético, que o unificou, pedaço a pedaço, na República Soviética Socialista Ucraniana. A representação diplomática ucraniana desmentiu esta versão, contrapondo outras evidências históricas e indo ao encontro de observadores internacionais que vêm a interferência da Rússia, como a materialização do sonho de Vladimir Putin em reconstruir territorialmente a antiga União Soviética. Mais, relembra o regime totalitário a que o Kremlin submeteu a Ucrânia através de uma política de terror, que se caracterizou pela violação maciça dos direitos humanos, incluindo deportações, torturas, perseguições, assassínios e outras formas físicas e psicológicas. Com a queda do Bloco de Leste, a Ucrânia resgatou a soberania sobre o seu território mas seguiram-se os acontecimentos que desembocaram no actual clima de guerra civil: as manifestações dos nacionalistas e dos defensores da integração europeia na Praça da Independência, em Kiev; a deposição do presidente pró-russo Viktor Yanukovych; e, finalmente, por parte da Rússia, a invasão da Crimeia e a colocação de contingentes militares junto dos separatistas do leste da Ucrânia.

Plemya (A Tribo, 2014) de Myroslav Slaboshpytskyi

Este pequeno inventário de acontecimentos relativos à recente história política da Ucrânia vem a propósito da estreia de Plemya (A Tribo, 2014), a primeira longa-metragem do realizador ucraniano Myroslav Slaboshpytskyi, que constrói uma narrativa em que a sua experiência pessoal se cruza subtilmente com a memória colectiva ucraniana. Slaboshpytskyi cresceu num bairro das imediações de Kiev, com o nome de Stalinka, em homenagem a Josef Stalin, e foi aí que rodou Plemya, durante o mesmo período em que Sergey Loznitsa, na Praça da Independência, acompanhava as movimentações populares contra a política pró-russa de Viktor Yanukovych para o excelente documentário Maiden (A Praça, 2014). Como se o percurso da câmara de Chantal Akerman pelos “espectros de Marx”, em D’Est (1993), não tivesse terminado em Moscovo, mas sim em Kiev, décadas depois, fixando-se num impulso nacionalista que, perigosamente, acumula “ruínas sobre ruínas” e as lança sobre os “olhos esbugalhados, a boca escancarada e as asas abertas” do “anjo da história”.

A singularidade de Plemya consiste em que todas as personagens comunicam através de língua gestual, sem o recurso a tradução, legendas ou voz-off, que possam orientar a maioria dos espectadores. 

A acção de Plemya é centrada num espaço definido, um internato para surdos-mudos, mas a localização temporal não é evidenciada, podendo corresponder a qualquer um dos momentos acima referidos.  No primeiro plano do filme, o espectador e o fundo da cena – onde um novo estudante, representado pelo actor Grigoriy Fesenko, procura pistas sobre a localização do internato, comunicando com pessoas que aguardam a passagem de um autocarro – são separados por uma estrada movimentada. O ruído constante dos automóveis apaga qualquer traço verbal que exista do outro lado da estrada. No plano-sequência que se segue, a câmara acompanha Grigoriy Fesenko que se aproxima do internato, sendo repetido o mesmo dispositivo, desta vez usando uma superfície de vidro. Enquanto o estudante contorna o internato até à porta principal, ficamos nas traseiras, atrás da vidraça, a uma distância que nos permite observar o que parece ser uma cerimónia, a acontecer do lado contrário, no exterior do edifício, mas não discernir claramente o que se passa. Quando o corpo docente e os alunos entram dentro do edifício, ainda posicionados atrás da vidraça, pela linguagem corporal percebemos que se trata de uma escola para surdos-mudos.

Opções formais à parte, não estamos longe do universo de Kids (Miúdos, 1995), da obra fotográfica e cinematográfica do seu realizador Larry Clark e dos filmes vindouros dos seus produtor e argumentista, Gus Van Sant e Harmony Korine, respectivamente. A singularidade de Plemya consiste em que todas as personagens comunicam através de língua gestual, sem o recurso a tradução, legendas ou voz-off, que possam orientar a maioria dos espectadores. Num conjunto de longos planos-sequência, sem pinga de paternalismo, Grigoriy Fesenko é introduzido na organização do internato e na sua violenta economia de sobrevivência, transversal à idade e hierarquia, abrangendo um esquema continuo de pequenos roubos e prostituição. Este domínio é expandido para além dos limites do internato e exercido segundo rituais tribais, indiferentes a cauções morais.

Plemya (A Tribo, 2014) de Myroslav Slaboshpytskyi

São personagens aparentemente amorais, marginalizadas pelo jogo social, e que, por isso, criam o seu próprio sistema de regras – a sua única verdade. A existência deste pequeno mundo é uma vitória contra o cinismo civilizacional, sublinhando cada acção violenta como inerente à existência do sistema e como resposta plausível forjada pela impotência individual. É a nossa falsidade e fingimento que reconhecemos na cena em que uma das personagens é estupidamente atropelada por um camião, por não puder ouvir o obrigatório alarme sonoro de uma máquina pesada, em marcha atrás. A câmara mantém a devida distância, como em todas as outras cenas. Não nos é pedida compaixão, sendo o lugar do rapaz na pequena economia prontamente preenchido por Grigoriy Fesenko, na execução das suas tarefas.

 Plemya tem a qualidade intemporal que mantém actualidade enquanto metáfora das tensões da sociedade ucraniana, tragicamente em busca de um estilhaçado projecto europeu. 

A utilização do plano-sequência e a eliminação do corte, apontam para uma fluidez temporal que casa bem com o dispositivo documental. Mas não nos iludamos, pois estamos perante uma realidade que é claramente resultado de uma construção. A eliminação da língua verbal apenas resiste enquanto consignados a este espaço-cápsula. Abrangendo o resto do corpo, os seus movimentos e expressões faciais, a língua gestual não reside apenas nos sinais desenhados com as mãos. Assim, o olhar do espectador percorre a ênfase corporal dos actores, em que a subtileza da representação cede a favor de uma expressão marcada, para melhor ser captada visualmente. Fora deste mundo, aguarda-nos um mundo em constante agressão, como é acentuado na referida cena de atropelamento ou, ainda mais violentamente, durante a interrupção da gravidez de Yana Novikova, por quem se apaixona Grigoriy Fesenko, parecendo incapaz de exprimir inteiramente, através do grito, a dor a que é submetida.

Apesar de encontrarmos algumas experiências semelhantes às produzidas pelo cinema mudo, no final somos lembrados que não é desse formato que se trata, pois continuamos a ouvir os passos de Grigoriy Fesenko a descer as escadas, com a imagem a preto. No, entanto, o filme remete-nos para algumas considerações de André Bazin a propósito da “arte muda” e da passagem para o cinema sonoro. O critico francês nota que, em 1929, se explicaria, e até se justificaria, o desespero daqueles que se manifestavam contra o desmantelamento da “perfeita cidade da imagem” representada pela “arte muda”, pois “na via estética em que se encontrava, parecia-lhes que o cinema se tornara uma arte supremamente adaptada ao constrangimento delicado do silêncio e que portanto o realismo sonoro só poderia cair no caos.” Sugere ainda, se não estaria na altura de questionar se, a revolução técnica da introdução do som, corresponderia a uma revolução estética. É o jogo imperfeito de “cidade da imagem” e de “constrangimento do silêncio” que mais nos agrada em Plemya, uma qualidade intemporal que mantém actualidade enquanto metáfora das tensões da sociedade ucraniana, tragicamente em busca de um estilhaçado projecto europeu.

Plemya (A Tribo, 2014) de Myroslav Slaboshpytskyi

 

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Carlos Alberto Carrilho

"I took a couple of papier-mâché rocks from the nearby studio, probably leftovers from some sword and sandal flick, then I put them in the middle of the set and covered the ground with smoke and dry ice, and darkened the background. Then I shifted those two rocks here and there and this way I shot the whole film." Mario Bava

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1 Comentário

  • A Quiet Place (2018) de John Krasinski | À pala de Walsh diz: Maio 4, 2018 em 11:08 am

    […] sem poderem falar – o meu colega Carlos Alberto Carrilho dedica-lhe um elogio maior e melhor aqui. Em A Quiet Place, as personagens podem falar, mas evitam fazê-lo por uma questão de […]

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