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À pala de Walsh
Festivais, New Horizons 3

Sunday in the Country: estória do cinema que nos visitou

De Luís Mendonça · Em Julho 31, 2013

Nudez. Não deve ser por acaso que seja esta a primeira palavra a vir-me ao espírito enquanto escrevo o breve relato que se segue sobre o que me fez aviar malas para Wroclaw, Polónia, no dia 24 de Julho para aí permanecer até dia 29. Fui até lá através de um evento dentro do evento maior que foi a 13ª edição do festival de cinema New Horizons. O nu aqui começará por ser metafórico, mas – não se desiluda, caro leitor – vai lentamente converter-se em algo mais concreto (ou literal) ao longo das próximas linhas.

A convite do Instituto Camões em Varsóvia, parti para a agradável cidade de Wroclaw com o intuito de, durante três dias, partilhar vivências e conhecimentos com uma comunidade de jovens cinéfilos, jornalistas e críticos provenientes de vários pontos da Europa (para além da Polónia, Alemanha, Suíça, Bélgica, Hungria, República Checa e, claro, Portugal foram os países representados).  Esta comunidade gerada espontaneamente de uma iniciativa sem qualquer outro interesse ou finalidade que não o da comunhão cinéfila vai ter como cenário uma casa de campo, situada a cerca de 30 minutos da cidade e suficientemente posta “fora do mundo” para nela nos acharmos sós, connosco, com os nossos iguais “estrangeiros”, com os que estiveram ali no nosso lugar em edições anteriores – e as suas histórias, contadas e revividas pelos organizadores -, com as imagens de filmes que se projectavam para, depois, entre refeições, alimentarem efusivas e divertidas discussões… Fora do mundo, disse eu? Em certo sentido, naquele sítio “isolado”, todos nós sentimos que o mundo, todo o mundo, estava disposto a fazer-nos uma visita.

Sunday in the Country. Este é o nome da iniciativa que propõe então uma aproximação entre pessoas que pensam e escrevem sobre ou através do cinema. É informal ao ponto de logo após o primeiro jantar já todos os convidados estarem razoavelmente confortáveis com o ambiente, o cenário e a novidade de tudo. O cinema é o nosso país em comum e aquele cenário de campo junta-nos a nós, pessoas de cidades europeias mais ou menos longínquas, num mesmo processo de mudança. Nada é forçado sobre nós, sem ser a descontraída confraternização. Que filmes nos marcaram este ano? Que realizador ou realizadores gostaríamos de ter ali, na nossa “nova morada”, a jantar connosco? A pergunta anuncia o que acontecerá nos dias seguintes: alguns dos principais realizadores presentes no festival New Horizons em Wroclaw irão comer ao nosso lado e, entre garfadas e tchin tchins, inevitavelmente dar a conhecer uma parte de si a cada elemento desta família multinacional de dedicados cinéfilos.

Respondi que gostava de partilhar aquele jantar com James Benning. A resposta saiu-me sem hesitar, porque Stemple Pass (2012) ainda ocupava – e a verdade é que ainda ocupa – o meu espírito. Vira o filme nesse mesmo dia, às 10 da manhã, no gigantesco cinema (um total de 9 salas!) que recebe o New Horizons. Esperava encontrar uma obra-prima e uma sala vazia à sua frente. Para meu espanto, falhei rotundamente na segunda previsão: o público, maioritariamente jovem, não parava de chegar. Mesmo sendo eu um fã de Benning, tenho de admitir: 10 da manhã mais James Benning não é um desafio que seja acessível a todos. Mas a gente de Wroclaw é jovem, entusiástica e vê neste festival uma oportunidade para projectar mais longe e mais alto a imagem desta cidade que será Capital Europeia da Cultura no ano de 2016.

Stemple Pass lança-nos um poderoso feitiço ao longo de quatro planos estáticos sobre a mesma paisagem, correspondentes às quatro estações do ano, cada um dos quais com uns módicos 30 minutos de duração. Em narração over, ouvimos os diários e as confissões de Ted Kaczynski, o terrorista norte-americano que ficou conhecido como “the unabomber”. Nos anos 70, este homem doutorado em matemática pela Universidade do Michigan auto-excluiu-se da sociedade, afastou-se dos ruídos da civilização tecnológica, numa espécie de reedição ultra-radical de Walden. Daqui resultou um manifesto e uma acção terrorista (necessariamente terrorista, dirá o próprio) através de encomendas armadilhadas enviadas (por correio) a professores, cientistas e políticos. A serenidade e respiração da paisagem natural são interrompidas pelos relatos crus, por vezes brutais e primitivos, por vezes perigosamente elaborados e, apetece dizer, “convincentes” desta voz sem corpo, cuja presença se faz simbolizar pela cabana que James Benning construiu à imagem da habitação original.

A casa de campo em Sunday in the Country não era uma barraca primitiva, mas parecia que, em certa medida, este filme de Benning lia à distância o cenário que se avizinhava. Talvez naquele jantar tivesse começado por perguntar até onde o realizador americano se revia nas posições –  atenção: não a prática – de Kaczynski . Quando ruidosas motas de água destroem a calma de um dos lagos de 13 Lakes (2004) ou quando, em RR (2007), um comboio rasga uma paisagem natural, com a indiferença e sobranceria que atribuímos a quem o criou; quando na tecnologia já não vemos, enfim, sinais do seu criador, a questão “para onde caminha a sociedade humana?” parece transbordar bem para lá da superfície da paisagem filmada.

Da nossa casa, ao longo dos três dias em que vivemos juntos, um Kaczynski polaco que vivesse nos bosques da frente não ouviria mais do que o som das nossas vozes tentando desmontar o filme que acabáramos de ver, muitas vezes (mais do que as desejadas, seguramente), tentando articular as nossas frustrações face ao objecto mostrado. Ao fim do dia, da nossa casa o Kaczynski polaco talvez ouvisse mais qualquer coisa: ao grupo juntava-se a voz do realizador. Sob o efeito de filmes como Noche (2013) e L’inconnu du lac (2013), a floresta que nos rodeava parecia ganhar contornos de mistério. Nos dois filmes, a Natureza esconde algo da sociedade, seja um grupo que regista e classifica todo o tipo de sons que fazem o seu mundo, seja uma subcultura do sexo homossexual entre as árvores e arbustos de uma floresta junto a um lago paradisíaco. Em ambos os filmes o sexo é usado como efeito de choque, sendo que o décor selvagem contextualiza a dureza das relações afectivas entre homens. Na nossa casa de campo, apenas houve nudez espiritual entre nós e a indiferença humana no ecrã de modo algum contaminou o ambiente audio/visual fora dele.

Leonardo Brzezicki, realizador de Noche, foi o nosso primeiro convidado e com ele veio também o afabilíssimo Mark Cousins (a quem coloquei algumas questões que, em tempo próprio, serão publicadas aqui mesmo, no À pala de Walsh). Para além dos seus mais recentes filmes – o documentário A Story of Film: An Odyssey (2011) e os seus ensaios visuais  What is This Film Called Love? (2012) e A Story of Children and Film (2013) -, veio com ele uma paixão quase adolescente pelo cinema – e escrevo “adolescente” procurando, sem ratoeiras escondidas, o sentido mais positivo da palavra. Na realidade, como já se percebe muito nitidamente em What is This Film…, essa cinefilia insaciável é acompanhada por uma raríssima capacidade de se entusiasmar pelos detalhes mais ínfimos da vida. Da mesma forma, a sua personalidade está definitivamente tomada por uma contagiante joie de vivre. A nudez de que falei no começo e que atrás apelidei de “espiritual” ganhou um novo sentido com a visita de Cousins, que já naquele filme expunha sem grande pudor, evocando a memória histórica de Eisenstein, algumas cenas da sua vida particular, numa tentativa (a meu ver fracassada) de casar o cine-diário com o documentário pedagógico. A certa altura, para sentir o “lado não indiferente da Natureza”, Cousins desembaraça-se de todas as peças de roupa que traz consigo para passear, livre e descomplexado, pela paisagem agreste de Monument Valley. Uma festa noite adentro, com uma piscina à entrada da nossa casa, motivaria que parte do que víramos no ecrã transbordasse para a realidade, que assim – por uma vez? Não, mais uma vez! – produzia a imitação quase perfeita do cinema. Numa palavra, ali, naquele momento, envolvido pela escuridão densa da noite, “O Desconhecido da Piscina” não era, definitivamente, Mark Cousins.

A nudez espiritual passou a nudez ou semi-nudez de facto numa “noite líquida” que definitivamente não estava no programa. À falta do lago havia uma pequena piscina, mas o clima era ameno, sano e leve. Por outro lado, o mistério, todo o mistério do mundo, só cabia nas imagens do cinema que trazíamos connosco e nas que estávamos dispostos a re-guardar (regarder). De qualquer maneira, a música, o splash, as gargalhadas dionísiacas eram audíveis à distância. O som ao redor da cabana do Kacyzkni polaco virava poluição incivilizada…. Mas não: para esta personagem que nunca existiu – será que Cousins esteve de facto despido na nossa piscina? Se calhar, caro leitor, invento tudo isto sob o signo do cinema visto – não há nada que se assemelhe a uma poluição incivilizada, já que toda a civilização é poluição desumanizante em potência. No filme de Kleber Mendonça Filho, O Som ao Redor (2012), um edifício de ruídos é construído à medida que vamos conhecendo um bairro de classe média alta do Recife. Os condomínios fechados, os arranha-céus, as muralhas de segurança erigidas à volta… Nada comunica com o exterior, mas também nada nem ninguém evitará que os ruídos circulem de um apartamento para o outro, tal qual a bola do menino pobre que vai parar ao pátio da menina rica.

Na casa de campo, encontrei vários exemplos de como, por muito culturalmente distintas que sejam as proveniências dos seus habitantes, subsiste sempre nas nossas vidas um canal que acabará por provocar algum tipo de contacto com o “pátio do vizinho”. E esse canal, sem surpresas, dá pelo nome de cinema. Foi dele, nele e por ele que uma família nasceu, cresceu e se separou no espaço de poucos dias. Foi também dele, nele e por ele que uma comunidade de estrangeiros se tornou numa família animada de cine-irmãos. Aliás, o fantasma de Serge Daney, o crítico favorito de Cousins, o homem que sempre entendeu o cinema como uma forma de viagem ou um princípio de descoberta do “outro”, também não era “O Desconhecido da Piscina”. Pelo menos isso, caro leitor, posso eu assegurar como sendo a mais inequívoca das verdades.

Este redactor sortudo quer agradecer a todos aqueles que tornaram possível esta experiência, especialmente a Pascal Eddelman, Jakub Duszynski e Dorota Kwinta.

Consulte a cobertura mais exaustiva dos filmes vistos no festival New Horizons através deste link para o blogue CINEdrio.

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Luís Mendonça

"The great creators, the thinkers, the artists, the scientists, the inventors, stood alone against the men of their time. Every new thought was opposed. Every new invention was denounced. But the men of unborrowed vision went ahead. They fought, they suffered, and they paid - but they won." Howard Roark (Gary Cooper) in The Fountainhead (1949)

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